terça-feira, 25 de agosto de 2015

Visibilidade lésbica? Ou invisibilidade?

Estamos na semana da visibilidade lésbica, e, conforme manda o figurino, era para estarmos tendo nossas pautas levantadas, discutidas e respeitadas, era para estarmos tendo diversos eventos sobre nós, era para estarmos tendo textos sobre nós. Entretanto, somos esquecidas e invisibilizadas a tal ponto que nem mesmo na semana que deveríamos ser relembradas, o fazem.


Nós, lésbicas, temos a todo momento a nossa sexualidade apagada, seja por homens que nos fetichizam e não nos respeitam, seja pelo movimento LGBT que apaga lésbicas e não trata de nossas pautas, que joga nossas vivências pelo ralo e as trata como algo menos importante.


Mas, afinal, o que é ser visível? O que é visibilidade lésbica?


Visibilidade é termos espaço para falarmos de nós mesmas, de nossas vivências lésbicas, é podermos falar de prevenções sexuais para lésbicas, é conseguirmos que nos vejam como lésbicas e nos respeitem, e que não nos tratem como indecisas, modinha, desviantes que precisam ser “corrigidas”. Que tenhamos visibilidade na sociedade, ou seja, que sejamos reconhecidas enquanto lésbicas, e isso implicaria em não termos mais que ter medo de levarmos nossa namorada/companheira conosco a lugares, pois não correríamos mais o risco de sermos rechaçadas e agredidas, em não termos mais que justificar para pessoas heterossexuais o motivo de já termos nos relacionado com homens, e que isso não fizesse com que essas pessoas achassem que têm o direito de nos desrespeitar e de forçar-nos a conhecer homens, visto que, para essas pessoas, só estamos passando por uma fase “indecisa”.  É termos nossas relações respeitadas, é termos nossas relações vistas como relações, e não como “apenas duas amigas”, “colegas, é termos uma representatividade real, e não essas migalhas estereotipadas que a mídia nos dá como forma de calar a nossa boca. É não sermos forçadas a nos relacionarmos com as ditas “mulheres trans”, porque, afinal, lésbica se relaciona com mulher, mulher mesmo, aquela que nasceu com vagina, e não com quem possui um falo, é não sermos usadas por mulheres heterossexuais e bissexuais e depois descartadas, é não termos que explicar que ser butch e ser femme nada tem a ver com ser “passiva” ou “ativa”, pois sempre usam isso para transformar nossas relações em performances de relacionamentos heterossexuais.


E porque somos invisíveis?


Porque o patriarcado nega a nossa existência duplamente: por sermos mulheres e por sermos lésbicas. Não somos reconhecidas como mulheres na sociedade, somos vistas como mulheres que querem ser homens, que performam o gênero errado (isso dá margem para nos forçarem a acreditar que somos homens transsexuais. Há um texto sobre isso aqui no blog). Nós batemos de frente com o macho patriarcal apenas por existirmos, pois provamos que uma mulher não precisa se relacionar com um homem para ser completa. Ela não precisa de nada do que a sociedade heteropatriarcal impõe como felicidade, pois na verdade tudo isso que essa sociedade mostra só serve ao homem, e não a ela.


Somos invisíveis porque nossa visibilidade assusta e faz com que o macho patriarcal tenha medo de que a sua dominância caia. Somos invisíveis porque é mais fácil nos invisibilizar e fazer com que a heterossexualidade compulsória continue existindo do que nos visibilizar e libertar as mulheres da compulsoriedade heterossexual. Somos invisíveis porque a mulher não importa nessa sociedade, muito menos uma lésbica.


A existência lésbica é uma ameaça para o patriarcado, por isso somos invisibilizadas. A lesbiandade liberta a mulher das amarras patriarcais que servem ao homem, ela deixa a mulher livre para viver plenamente, e é por isso que temos nossa existência negada. O homem não quer que saibamos que é possível ser lésbica, que a heterossexualidade é um sistema de controle e que quem rege o mundo é o homem, e que este não se importa com nada além de si mesmo. Conforme disse Solanas (1967) “o macho é um egocêntrico total, um prisioneiro de si mesmo incapaz de empatizar ou de identificar-se com os outros, incapaz de sentir amor, amizade, afeto ou ternura. É um elemento absolutamente isolado, inepto para relacionar-se com os outros, suas reações não são cerebrais, mas viscerais; sua inteligência só lhe serve como instrumento para satisfazer seus impulsos e suas necessidades. Não pode experimentar as paixões da mente, as interações mentais, somente lhe interessam suas próprias sensações físicas. É um morto vivo, uma excrescência insensível impossibilitada de dar, ou receber, prazer ou felicidade. Consequentemente, e no melhor dos casos, é o cúmulo do tédio, é apenas uma bolha inofensiva, pois somente quem é capaz de absorver-se nos outros possui encanto. Preso a meio caminho numa zona crepuscular entre os seres humanos e os macacos, sua posição é muito mais desvantajosa que a dos macacos: ao contrário destes, apresenta um conjunto de sentimentos negativos – ódio, ciúmes, desprezo, asco, culpa, vergonha, incerteza – e, o que é pior: tem plena consciência do que ele é e do que não é.”
Mas dia 29, não é para bissexuais também?


Não, dia 29 de agosto é o dia que comemora, relembra e é dedicado ao 1º Senale (Seminário Nacional de Lésbicas) que ocorreu em 1996, bissexuais tem uma data especifica para que possam pedir por suas demandas. É importante frisarmos o quanto o 29 de agosto é representativo para a comunidade lésbica e o quanto ver outras pessoas, que não lésbicas, tentando usar deste dia é violento para lésbicas. Nós não temos espaço de fala em lugar algum, o movimento LGBT prioriza primeiramente as demandas e pautas de homens gays e mulheres transexuais (o que me intriga, já que mulheres transexuais também foram socializados enquanto homens, eu diria que rola broderagem?), nossas vivências tem sido constantemente desqualificadas e desmerecidas pelo movimento Feminista que tem se colocado de modo liberal ao adotar o discurso da bissexualidade e o “amor à pessoas” colocando, mais uma vez, lésbicas à marginalidade e as coagindo a se adequarem e se relacionarem com homens. O feminismo tem andado de mãos dadas com o movimento LGBT em busca de apagar e silenciar lésbicas e tem aderido ao discurso transativista de que lésbicas podem ser homens trans pelo simples fato de não se relacionarem com homens. Mulheres lésbicas tem sido constantemente perseguidas e excluídas por feministas com o intuito de as silenciarem  e desvincilharem a imagem do Feminismo das Lésbicas. Feministas tem buscado por aprovação de homens e, tem, efetivamente, afastado lésbicas do movimento.  O dia 29 de agosto não é relembrado por esses movimentos por se tratar de dar visibilidade e voz à mulheres marginalizadas. Não nos esquecem por acidente, nos esquecem porque andam de mãos dadas ao heteropatriarcado, porque incomodamos quando gritamos e nos impomos, incomodamos quando resistimos e quando nos negamos a nos adequar aos padrões destes movimentos. O dia 29 é pra relembrarmos que somos muitas e que quando nos unimos fazemos barulho, incomodamos e o patriarcado treme ante nossas palavras, ante nossos relacionamentos, ante nossa presença.

Sapatão
Fancha
Cola-velcro
Tesoura
Tribadista
Roçadeira
Caminhoneira
Butch
Femme
Lady
Subversão
Histórias não contadas
Histórias mal contadas
Histórias exterminadas
Violências sofridas
Violências vividas
Violências sentidas
Luta até a exaustão
Feridas abertas
Feridas cicatrizadas
Feridas anestesiadas
Pela dor
Pelo rancor
Por amor
Amor, amar
Amor, lutar
Amor, gritar
Amor, combater
Amor, sobreviver
Sobreviver e ser
Ser do bem
Ser do mal
Ser alguém
Ser marginal
Existir
Transgredir
Resistir
Ser. Lésbica.
Por: Lacuna Rat e Marx Lopes

5 comentários:

  1. Obrigada pelo texto, muito bom mesmo!
    Mas acho que falar em broderagem dos homens com mulheres trans é bem equivocado, não existe nenhuma solidariedade dos homens cis com as mulheres trans, bem sabemos q é o contrário disso. O destaque (mais ou menos né) q as mulheres trans recebem do movimento LGBT não precisa ser diminuído pra visibilizarmos as outras letras. Vamos focar na lesbofobia por si só :)

    ResponderExcluir
  2. Oi Fernanda! Não estamos diminuindo, quando falamos em broderagem é que pessoas nascidas e socializadas homens sempre terão destaque e até certo respeito, principalmente no meio LGBT, onde pessoas nascidas e socializadas enquanto mulheres são apagadas e excluídas, isso não é diminuir, é encarar a realidade como ela o é. Abraços

    ResponderExcluir
  3. Só acho que falar das bissexuais como se fosse regra o fato delas usarem as Lésbicas é terrível e bifóbico. Além de que desmerece o fato de que bissexuais TAMBÉM gostam de mulheres. E que lésbicas também podem usar e descartar as próprias lésbicas. Às heterossexuais ser atribuído essa característica de uso de lésbicas, acho mais lógico, já as bissexuais, não.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá, Débora, nós falamos de modo geral e de modo geral é exatamente isso que acontece. No demais, o debate sobre bifobia se dá em outro texto aqui no blog mesmo. Abraços.

      Excluir
  4. Eu acho uma bosta isso por causa da estereotipagem que sobra é quem não faz parte disso acaba levando também. Mas.. vida que segue
    Mas cada um tem o direito de escolher se quer ficar ou não com mina bi né ? :)
    Gostaria de compartilhar que não partilho mais do conceito de bifobia o/ e isso é lindo HAHAHAH

    ResponderExcluir